quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Literatura

Noel Rosa: O poeta do samba e da cidade

por Kelly de Souza | História, Literatura, Música, livros
No começo dos anos 1930, Noel Rosa percorria o Rio de Janeiro a bordo do seu Chevrolet dois cilindros, cor de azeitona, apelidado Pavão. O bairro carioca de Isabel era, no início do século XX, uma das áreas mais musicais da cidade. Foi lá, na Rua Theodoro da Silva, que em 11 de dezembro de 1910 nasceu o compositor-poeta. Disse Tom Jobim que “poucos compositores cantaram o Rio melhor que Noel. O Rio das gírias, dos costumes, da malandragem, da graça, da delegacia policial, do revólver, do xadrez, do Tarzan, dos bairros, da sua querida Vila Isabel”.
Isso porque ele costurou a geografia carioca com seu samba, com sua poesia urbana que nasce do cotidiano das ruas. Essa relação umbilical entre a obra de Noel Rosa e o local de onde veio o artista é contada, em homenagem ao centenário de seu nascimento, no livro Noel Rosa – O poeta do samba e da cidade, do historiador André Diniz, também autor das biografias dos chorões Joaquim Callado e Anacleto Medeiros, etc. Segundo o pesquisador, Noel Rosa marcou de forma definitiva a história da música popular brasileira com a miscigenação do samba, com um sotaque das percussões do morro, com surdo, tamborim e cuíca, e com uma poesia clara, objetiva e repleta de palavras do cotidiano carioca.
Do primeiro sucesso, “Com que roupa?”, gravado em 1930, até a última composição “Último desejo”, de 1937, o andarilho Noel Rosa construiu sua obra em um Rio de Janeiro em pleno processo de crescimento urbano, testemunhando a transição entre o Brasil rural da Primeira República e o Brasil, que a partir da década de 1920, se transformou em um país cada vez mais urbano. “O Rio fez Noel, e Noel fez o que conhecemos como Rio e como carioca. A sua poesia popular apresenta essa cidade em transformação, com seus tipos, seus espaços de sociabilidade e seu cenário marcado pela exclusão e pela promiscuidade das classes sociais”, explica Diniz. Para ele, nenhum compositor destilou tanta experiência e percepção nas trocas de linguagem com artistas de diferentes origens sociais.
Luiz Antonio Simas, autor de Samba de enredo - história e arte, entre outros, explica que vários são os casos, na história da música brasileira, da íntima relação entre a obra criada e o local de onde veio o artista. É impossível, por exemplo, compreender Luiz Gonzaga sem o sertão nordestino, Dorival Caymmi sem o mar da Bahia e Adoniran Barbosa sem São Paulo. Noel é ainda hoje, cem anos depois de seu nascimento no bairro de Vila Isabel, o grande poeta de uma cidade que ninguém resiste, na beleza triste de um samba-canção. “Longe de ser um expectador passivo dessa realidade feérica de transformações, Noel resolveu viver no olho do furacão e atuou como um verdadeiro mediador cultural entre o asfalto e o morro, o saber letrado e o saber popular. Sua obra é talvez o exemplo mais bem-acabado de uma cultura que rompe fronteiras, investe em circularidades que se influenciam e escancara a riqueza impura e cheia de vitalidade do que era e é a cultura carioca”, conta Simas.
É justamente esse Noel e esse Rio que o livro “O poeta do samba e da cidade” retrata. Além desse passeio histórico pela cultura brasileira, o livro – ricamente ilustrado – traz um CD com novas gravações de clássicos como “Com que roupa?”, “Palpite infeliz” e “Três Apitos”. Diniz conta que o compositor era ligado à tradição modernista que viria influenciar grande parte da MPB. “Talvez a obra de Chico Buarque e Caetano Veloso não seria a mesma sem a influência de Noel”.
Noel Rosa morreu aos 26 anos, depois de mudar a Música Popular Brasileira. Ainda hoje, muitas de suas 259 composições continuam sendo regravadas por diversos artistas. Vale sempre lembrar!
Cena do filme Noel, o poeta da Vila com a música ”Último Desejo” cantada pelo Mestre Wilson das Neves. 
créditos:Blog da CULTURA
Kelly de Souza é jornalista colaboradora da Revista da Cultura e Blog da Cultura.
assista o vídeo, link aqui

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